GURGEL, Carolina Provvidenti de Paula (2002) – O relatório psico-pedagógico e sua importância para o trabalho do
professor. UnB p. 1-30.
1) Uma introdução Critica
A
todo momento, a educação escolar nos impõe na pratica docente e também na
cultura escolar uma pecha ao aluno deficiente. Deficiência ou maneiras diferentes
inclusive de existir? De forma quase que inevitável esses estereótipos, vão
impedir ou abortar o ensino dos alunos deficientes. Notem, o ENSINO, não sua
aprendizagem.
Essas
barreiras, inclusive institucionais e de práxis docente foram identificadas
pela mestra em educação Andrea V. Cavalcante (2004) em alguns fenômenos bem
documentados sobre a deficiência como por exemplo o isolamento/exílio do
deficiente da sociedade. Tendo por responsável a família e em última instância
o estado que ainda esconde a diversidade humana. Em sentido ontológico seria da
própria natureza da espécie humana, ser diversa e plural.
Apesar
de termos, nos humanos uma diversidade de fenótipos que nos mostra nativos da
Austrália, num padrão fenotípica (geralmente negros, rosto típico,
comportamento também identificado de forma comum enquanto cultura), outros,
como os asiáticos, já com um “padrão” identificável. Porem, o padrão vai entre
aspas, mesmo por que ainda dentro os asiáticos a diversidade e também imensa,
assim como latinos diversos, germânicos, etc.
Porém,
mesmo dentre essa grande diversidade de rostos e melanina, alturas, cor dos
olhos, nariz, boca, cabelo, tipos ósseos... tudo isso não torna essa
diversidade, enquanto diversidade de espécie. A espécie humana se expressa
ligada geneticamente em uma e somente uma espécie – prova disso que existe
sempre compatibilidade sexual entre macho e/ou fêmeas para com qualquer outra
etnia, não a sua – que ainda sim, nasce uma criança humana.
Lembremos
que tais situações são expressões de espécie, agora outra dimensão da
existência humana e sua dimensão enquanto ser histórico e que produz, constrói
e reconstrói cultura.
Dentro
desse contexto agora (cultural), inclusive de interesses políticos (forjando
ciências e verdades na ciência), se utilizando porcamente do que deixou
Darwin/Wallace et al para criar toda
uma forma de ver o mundo onde existiria uma linhagem de humanos superiores (e
essa ideia não e do nazismo e sim muito anterior, talvez ate com conteúdo
mítico) e humanos inferiores – onde logicamente, os deficientes seriam pessoas
inferiores e não diferentes, dada a pluralidade do existir humano.
Toda
essa matriz ideológica identificada como eugenismo ajuda na cultura do diagnóstico
e da avaliação psicoterápica do aluno e isso vem sendo grande obstáculo para
emancipações de alunos que são grandes cidadãos somente estão num processo de
invisibilidade. Os professores e a cultura escolar vêm levando os deficientes,
pouco a pouco ao isolamento e a invisibilidade social.
Inúmeras
são as situações históricas que o aluno deficiente passa em detrimento de quem é
considerado normal, o que são meros conceitos desarticulados, aliás, pré-conceitos
que falsamente se articulam muito bem e ate por vezes são convincentes em seus
discursos, porém identifica GURGEL (2002 p. 25) que “Não há ajuda que compense o ônus do rotulo de desviado, a pessoa é isso
e apenas isso e que a linguagem classificatória aplicada pela burocracia
escolar não cumpre uma função psicológica ou cientifica tanto quanto se supõe.”.
Isso
está acontecendo diariamente com a escola também por esses fatores. Assim,
podemos identificar em trabalhos posteriores, que o próprio discurso do
isolamento ou da redução do Outro torna-se mola propulsora para propagar as
lógicas do preconceito sendo uma das ferramentas mais consagradas pela
sociedade – o diagnóstico psico-pedagógico que se fundamenta quase sempre na psicometria.
2) Sobre a avaliação psicológica – a origem
Segundo
GURGEL (2002 a), tanto as revoluções (industrial na Inglaterra – provavelmente
pela fabricação das máquinas a vapor, e também pela complexidade social que
derivou a Revolução Francesa – consequentemente, trazendo um novo modelo
fabril, econômico e social trouxe consigo também para se emancipar, para ser
aceito no mundo econômico ter aptidões. Ora, se já não tem coordenação
motora para desempenhar um determinado trabalho, o isolamento e a pecha de
deficiente inválido, quase sempre será escutada ou utilizada como
racionalizações (freudianas) para tornar o deficiente invisível.
Diante
desse contexto conjuntural da sociedade – toda uma grande literatura eugenista
foi difundida para justificar os que estão aptos, fortes e normais (inclusive
para consumir) e os que são inaptos, fracos e deficientes, a craniometria de
Paul Broca, as escalas de Binet por meio de testes para mensurar a inteligência
dos alunos atrasados e provavelmente centenas de testes psicometricos foram sistematicamente
desenvolvidos.
O
tempo histórico passou e o debate esquentou com relação à eficácia dos testes
psico-pedagógicos.
Para Gonzalez Rey (1999) nenhum teste seria capaz de mensurar a diversidade
humana e inclusive a singuralidade de cada homem e mulher e de cada aluno.
Para
Moysés e Collares (1992) toda essa forma de pensar – ao rotular e classificar
os alunos por meio de testes produz uma generalizada isenção de
responsabilidade, resta à criança, o estigma e a baixa autoestima.
Para
GURGEL (2002 b) citando Correa (1995) uma espécie de inversão dos fins da
escola ao invés de emancipar, seria um ambiente propicio a geração de
obstáculos ao ensino de qualidade.
Em
termos gerais e segundo GURGEL (2002 c) citando Machado (1996) e de fato uma
OPÇÃO social por um modelo de saber e de filosofia de sempre se buscar
um culpado, concluindo que o fracasso escolar é a principal fonte de produção
da deficiência mental, sendo balizada pela avaliação psicológica e sendo
utilizada para fins também escusos à educação.
3) Repercussões da avaliação psico-pedagógica para a carreira
escolar do aluno
Vemos que a deficiência tem uma
explicação histórica e também por construções de discursos sociais que
introjetam uma espécie de pensamento que reduz ou que falsamente induz os
leitores a entenderem que se a pessoa não possui a aptidão para desempenhar uma
determinada função social por meio do trabalho, tal pessoa deve ter algum
¿déficit (em sentido irônico, a existência sendo convertida numa balança
comercial?), ora então os normais teriam um ¿superávit da inteligência pelo
fato de responderem os testes?
Os
desafios apontados por GURGEL (2002 c) em relação às limitações da psicometria
enquanto “virtuosa” ciência que vem limitando a existência de centenas de
milhares de seres humanos, também refletindo sempre interesses escusos para uma
educação de qualidade.
Temos
então, que o entendimento que por ser uma sociedade que não irá contestar o
poder de médicos e psicólogos, a criança sempre será o foco desse tipo de
discurso, inclusive estabelecendo sempre relações de poder desiguais e
injustas – em termos políticos, identificado por Patto (1997) ate como
crime de lesa humanidade tamanho estrago ideológico/cultural na esfera da
educação e na existência de alunos que somente vivem e que querem aprender por
meio de instituições que ofereçam gratuitamente um ensino/instrução de
qualidade.
Assim,
as práticas escolares tendo por fundamento o diagnóstico psicológico e médico
para dizer se nossas crianças se desenvolvem, vem mostrando em diversos casos a
possibilidade de falsear tais discursos – mas infelizmente mudanças sociais não
são tão rápidas quanto queremos que acontecesse – o que possibilitaria
inclusive causar um grande ponto de inflexão nas forças políticas que dominam a
escola, as práticas, os saberes e até a
própria existência.
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