quarta-feira, 28 de julho de 2010

Anotações Macroeconômicas da Crise de 2009





Mudanças estruturais e na natureza do capital*. Contribuições e possibilidades teóricas ao Fórum Social Mundial 2009 - Belém-PA - Brasil.

█Introdução█

Um grande e central paradoxo se faz antes mesmo de tentativas de resposta para a questão inicial: Diante da crise capitalista de hoje (2009), qual o caminho?

O paradoxo seria nas concepções e relações de poderes existentes na atual arena política.

O poder do capital* se sobressai hoje em relação ao Biopoder, aos poderes da democracia e do poder legal instituído. Segundo Azambuja citando Burdeau: " ...poder é uma força a serviço de uma idéia...". Em termos globais o ideário capitalista se sobressai (por sua força de aparato, de estrutura e de próprio ideário) em relação à vida humana e aos direitos fundamentais.

Azambuja cita que no decorrer da formação de nossa sociedade o poder se constituiu/constitui de forma social, difusa, de forma personalizada e institucionalizada.

Todas essas esferas do poder, já foram e agora são partes dependentes do poder do capital*. Um dos desafios desse artigo seria - encontrar soluções teóricas e práticas para mudar a natureza do capital*.

Com o advento da pós-modernidade, a política passou a ter objetivos como caráter funcional, e uma necessidade de reconciliação com a filosofia de Hegel e com a realidade existencial, mas com o aprofundamento da fetichização capitalista a filosofia se tornou exercício dialético e reflexivo para poucos.

A fetichização englobou (pela internacionalização do trabalho e da mão de obra) toda a cultura ocidental e agora toda a cultura global, tornando suas premissas dogmas e enrijecendo o desenvolvimento da civilização humana. Essa fetichização seria na verdade toda uma gama de comportamentos alienados (pelo ideário capitalista) que simbolizam a pós-modernidade em seu delírio consumista/fetichista.

A sociedade pós-moderna emburreceu o pensamento reflexivo e uniformizou a pluralidade cultural, de pensamento e de visão de mundo. A sociedade pós-moderna é necessariamente (em termos gerais) fetichista e etnocêntrica.

O colapso do sistema colonial, a museificação do ideário eurocentrico, a realidade multipolar, um novo fundamentalismo religioso, uma arena política mais complexa, desgastes no processo de conceber a política como ciência e parcelas de nacionalismos, a pregação de aversão à politização do povo foi alguns fatores políticos históricos em choque com a atual natureza do capital, que ajudou a ativar a atual crise capitalista. Em sentido de formação política o povo está menos organizado e consciente do, por exemplo, em 1968 e no processo constituinte de 1987.

Dentro dessa matriz de interesses, de matriz política - novos poderes que pululam na realidade agora multipolar começam a fazer a diferença prática (vide Venezuela, BRIC, outros países emergentes), numa contra lógica neocolonial, numa contra lógica policianesca e proibitiva de direitos fundamentais, por uma contra lógica plutocrática abre-se a brecha teórica para responder a indagação inicial: Diante da atual crise, qual o caminho? Em termos gerais - o caminho seria uma maior politização dos povos, garantindo sua plena auto determinação e soberania.

Vejamos agora essa proposição inicial analisada de forma mais detalhada:

- Uma das possíveis respostas à atual crise capitalista em sentido geopolítico, seria uma profunda reforma nas estruturas das democracias frágeis e relativas.

- Em sentido econômico e científico, tem-se a necessidade de mudança na natureza do capital*. Mudança na natureza do capital seria para que o mesmo pudesse não estar mais associado aos grandes conglomerados e única moeda. Mas para que, pela via estatal impessoal, ativar ciclos e cadeias produtivas auto-sustentáveis.

Cadeias produtivas na produção de alimentos mais baratos e saudáveis. Cadeias produtivas que possam estar desvinculadas do fetichismo e consumismo. Cadeias produtivas capilarizadas e voltadas para a mantimento e equilíbrio da vida humana não para a destinação de bilhões de dinheiro público para industrias bélicas, farmacêuticas mentirosas nem para a economias vulgares e especulações bancárias.

Mudanças na natureza do capital em uma nova configuração na utilização da terra e recursos naturais.

Mudanças na natureza do capital em uma nova configuração e resolução das mazelas da democracia representativa, concebida sob a lógica dos pesos e contrapesos de Montesquieu. Como fazer valer esses poderes em detrimento ao poder do capital? Não existe resposta satisfatória sem a atuação política do povo. Necessariamente politizada e politizadora para trazer soluções na mudança dessa natureza do capital - ser causa e ser fator preponderante na concepção de poderes do tipo (legal, judicial e de execução/administrativo)...

A forma de produzir capitalista é centralizada/internacionalizada, não agregada de valor, devastadora para biomas, de não sustentabilidade e de atendimento a um pequeno nacho da população mundial que viciadamente vende sua força de trabalho para adquirir um quantum de capital para que o mesmo possa vir a consumir o que ele mesmo produziu, mas com o torno cada vez mais apertado da mais valia. Toda essa natureza opressora e de exploração pela mais valia, inflação, taxas estatais dentre outras - faz a cada dia o valor do quantum de capital recebido (leia-se salário) ter cada vez menos poder de compra, ativando mais e mais um grande exército de reserva capitalista para concretizar a produção das mercadorias e que por sua vez a concretização da fetichização como modus vivendi e operandi do capital*.

O capital agora tornou-se um monstro abstrato e real ao mesmo tempo. Abstrato, por que é uma criação humana de nuances religiosas, não fundamentada na realidade e real, por que molda culturas, estados, coage e oprime camponeses, agricultores, pequenos comerciantes e civis em geral.

O torno da mais valia corroem salários e vicia a relação existente de causa e efeito entre TRABALHO e CAPITAL. Na atual crise, o mantimento desse "torno" mais apertado da mais valia em forma de juros, desemprego, férias coletivas, ataque e enfraquecimento sistêmicos de sindicatos, associações e movimentos sociais na retórica dos economistas são as chamadas "reestruturações de produção" não podem ser o carro chefe da atuação dos governos democráticos.

Um projeto de governo democrático deve encontrar a melhor saída política e conjuntural para se possível afrouxar taxas, mas nunca atuar na forma de resgatar capital líquido público para a liquidação de prejuízos capitalistas (muitas vezes de risco) privados.

A atual crise é mais uma falência teórica e prática da cartilha neoliberal austríaca, onde as forças intrínsecas de mercado conseguem resolver por si só suas disparidades e incongruências sistêmicas (por ser dogmática/religiosa) não fulcrada na realidade material e existencial dos povos.

A lógica seria o afrouxamento do "aperto do torno" da mais valia - diminuindo juros, lucros estratosféricos, promovendo a regulação e regulamentação mais precisa das máquinas públicas, congelando bens não lastreáveis e comprovados, instituindo definitivamente o imposto sobre herança, quebrando os laços viciantes entre choques advindo do poder do capital, em detrimento ao biopoder, aos poderes do povo, os poderes da democracia.

Mudanças na natureza do capital seria o término da lógica "laisse-fairerista" e de não regulamentação estatal ou de regulamentação de remendos e conchavos.

Essa lógica quer o mantimento geográfico de terras, riquezas, o mantimento de planejamento, mantimento de parques tecnológicos e produção científica somente para a fome de mega corporações que também usufruem a economia vulgar, do contrabando, do mercado negro, de mercados paralelos, da pirataria, dos lobbys corporativos que vicia os fiscais da lei e também dá causa a própria lei.

Com isso, uma mudança na natureza do capital*(vide O Capital - MARX, Karl) seria um enfraquecimento de seus "braços" acima da lei, do estado, do biopoder, dos direitos naturais e fundamentais para ai sim, ativar ciclos virtuosos de produção otimizada, de produção e de cadeias produtivas capilarizadas e voltadas para alta tecnologia, para otimização da máquina estatal, para o profundo planejamento civil e de organização cívica.E a via para que isso aconteça é a via da politização e aprofundamento das reformas democráticas (política, fiscal, previdenciária, urbana).

Mudanças na natureza do capital* para dar vazão a uma sociedade do futuro. Uma sociedade socialmente responsável por todos, filhos da terra ou estrangeira. Mudanças na natureza do capital é a promoção de uma cultura duradoura de paz (coisa que nunca existiu em todo o século XX e na história humana - ¿utopia) talvez sim.

O caminho para o enfrentamento da crise mundial (em sentido ecossocial) seria inúmeras mudanças na natureza e influência do capital, visto que o mesmo molda a lei, estados, a consciência e o pensamento humano.

Sendo por isso - entendido como uma mudança na natureza do capital (do fenômeno histórico moldado pelo mercantilismo/revolução industrial/internacionalização da mão de obra), seria uma profunda reestruturação social, política, de reformas legais que visem desatar, desvincular da atual natureza do capital, a produção material, as riquezas da terra e a livre difusão de conhecimento e cultura. Como o torno mais apertado da mais valia atua nas crises cíclicas do capitalismo, a garantia da fluidez virtuosa de emprego e renda passa pelo acúmulo de forças políticas progressistas, identificação de ideário conservador refutando-o em totalidade, a centralização das forças em torno de um projeto de Brasil desvinculado do capital ou parcialmente vinculado a este.

Mas para isso, toda uma mudança (que não precisa ser global) estratégica política, de estratégia de pais, de norte de país, de plano de governo, de planejamento estratégico e de inteligência, um plano de nação brasileira contemporânea que fomente, crie e execute novas cadeias produtivas independentes de nuances capitalistas - e que por plano de nação destituída de vícios antigos - todas as reformas centrais em pauta no congresso nacional precisam ser aprofundadas e executadas.

A via estatal é via de emancipação civil, mas ainda não garante mudanças na natureza viciada do capital*. Os vícios deveram ser também combatidos e solucionados pela politização geral do povo, pela atuação política capilarizada, pela organização política (necessariamente desarmada de violência, mas armada de ciência e estatísticas) que possa articular transformações locais/municipais.

E que possa também difundir conhecimento, autosustentabilidade, uma sociedade integrada ecologicamente com um novo capital**, um capital humano - concretizado em suas possíveis novas estruturas.

Uma nova sociedade sociocapitalista de natureza híbrida porem socializada, plural, diversa, equânime, ecológica e consciente.

Sim, um outro mundo é plenamente possível - mas para isso a natureza e a influência do capital devem ser modificados, mas de uma forma científica (não faltam dados e análises) e humana.

Tendo por referencial o biopoder juntamente com poderes representativos (quem sabe os novos poderes democráticos se pensarmos numa nova natureza do capital, de uma nova democracia contemporânea), ou quem sabe de um biopoder politizado.

Um biopoder politizante, integrado a uma sociedade tolerante, pacata, plural e consciente.

█Texto original em construção desde: janeiro de 2009.O autor.█
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©2007 '' Por Elke di Barros